Quis ser enfermeira, mas deixou o curso a meio para se dedicar ao atletismo. Desde o dia em que viu, aos 15 anos, Fernanda Ribeiro a cortar a meta em primeiro na prova de 10.000 metros dos Jogos Olímpicos de Atlanta, estipulou um objectivo: ser atleta. “Quis logo estar no lugar da Fernanda. Ver uma atleta portuguesa ser campeã olímpica num estádio cheio mexe com qualquer pessoa”, recordou Jéssica Augusto, especialista em provas de fundo, que viu o seu destino traçado naquela madrugada de 1996.
Sempre gostou de correr e já dava nas vistas nas provas de atletismo escolares – uma vez por ano, por exemplo, faltava às aulas para participar em corta-matos -, mas Jéssica até gostava mais de saltar. “Tinha a mania de que ia ser atleta de comprimento, mas percebi que não tinha sucesso. Era mais forte a correr”, assumiu.
A sua infância foi iniciada em Paris, onde nasceu, a 8 de Novembro de 1981. Mudou-se para Espinho aos seis anos por escolha dos pais. “Não sabia falar português e a adaptação foi difícil”, explicou. Pouco tempo depois, a família decidiu fixar-se em Braga, onde Jéssica acabaria por começar a sua carreira no atletismo. O Sp. Braga foi o primeiro clube que a acolheu, sob a alçada de Samira Araújo, treinadora da fundista olímpica Manuela Machado. “Logo de início, ela estabeleceu um objectivo a três anos. Disse que no primeiro eu iria ao Campeonato da Europa de corta-mato e ficaria entre as 20 primeiras – fui 12.ª; no ano seguinte, ficaria entre as dez primeiras – e fui oitava; e no terceiro ano iria era lutar pelas medalhas – e ganhei o ouro em Malmö, na Suécia”, recordou Jéssica.
Até 2007, ano em que se transferiu para o Maratona, Jéssica conquistou vários Campeonatos Nacionais de 1.500 e 3.000 metros em juniores, Sub-23, seniores e absolutos. Por essa altura, já tinha trocado de treinador, elegendo João Campos para lhe orientar a carreira. “Tinha uma boa treinadora, sempre acreditei no trabalho dela, mas precisava de um grupo mais profissional, que treinasse de manhã e de tarde, precisava de um incentivo”, explicou. Assim que João Campos lhe pôs os olhos em cima vaticinou que seria campeã europeia de corta-mato, o que acabou por se concretizar em 2010, em Albufeira – já depois de, em 2007, ter sido medalha de ouro em 5.000 metros nas Universíadas de Banguecoque, campeã nacional de estrada e corta-mato e prata no Europeu de corta--mato de 2008, um ano antes de ter começado a competir individualmente.
2011 foi um ano de viragem – e não pelas melhores razões. Jéssica estava em Paris quando perdeu o pai, em Maio, iniciando uma depressão que duraria dois anos – e que só não teve repercussões mais sérias devido à força de vontade da atleta. “Parei entre Novembro e Janeiro, mas depois sabia que tinha de começar a preparar uma maratona para fazer os mínimos para os Jogos Olímpicos de Londres. Foquei-me nisso e consegui”, recorda. No braço direito, tatuou o nome do pai, Arnaldo Augusto. “No dia em que ele morreu, eu estava em Paris e tinha marcado fazer uma tatuagem das argolas olímpicas. Mas quando regressei a Portugal para o funeral, resolvi tatuar o nome dele. Tinha dito ao meu pai que não podia morrer porque tinha de me ver nos Jogos Olímpicos de 2012. Ele respondeu que não ia conseguir mas pediu-me que quando eu cortasse a meta olhasse para o céu porque ele ia estar a ajudar-me”, relembrou a atleta, que conseguiu um surpreendente sétimo lugar nos Jogos Olímpicos de 2012 – até porque só por duas vezes tinha feito aquela distância, uma delas na Maratona de Londres, onde tinha obtido um oitavo lugar, com o segundo melhor tempo português de sempre, apenas superado por Rosa Mota.
No Europeu de Zurique, Jéssica conquistou o único bronze português na prova. Um regresso em força que, ainda assim, não preencheu as medidas da atleta. “Treinei para ser campeã da Europa, mas tacticamente corri mal. Podia ter arriscado mais e ter ido logo com as primeiras, lamentou Jéssica. Os Jogos Olímpicos de 2016 são agora o sonho maior de Jéssica, que não faz a coisa por menos no que à ambição diz respeito. “O meu objectivo é ser campeã olímpica e vou treinar para que os meus próximos anos sejam os melhores de sempre. Sinto-me com força para isso!”.
Em 2015, chegou ao Sporting CP e, este ano, contribuiu para a vitória na Taça dos Clubes Campeões Europeus, entre os demais títulos colectivos e individuais, nomeadamente o Campeonato Nacional de Clubes de Pista, em Setúbal. Voltou a entrar no top-10 da Maratona de Londres, uma das mais mediáticas e concorridas a nível mundial, e conquistou a medalha de bronze na meia maratona do Campeonato da Europa de Amesterdão.